domingo, 1 de março de 2015

Saudade, a palavra


1
Saudade não se traduz
Ninguém sentia
senão os portugueses
que a espalharam:
pastores, poetas, pulhas

como a gripe, a varíola,
e a sífilis

(até o mundo todo
ficar contaminado).

2
Ninguém sente saudade em russo?
O que corre nas cartas de Maiakovisk?
O que sentiu Gagarin ao ganhar o céu?
Qual era a cor dos olhos de Lênin no exílio?

Uma palavra inaugura tudo?
Inventá-la, ou traduzi-la,
basta para (a palavra) colonizá-los?

3
Tudo, dizem os filólogos,
por errarem pelos mares
(nunca dantes)
deixando para trás as amadas
os filhos, o cachorro, o gato
– saudade é para quem fica

4
Mas e os outros, não erraram?
Gregos e persas pelo Egeu
Fenícios nas praias da China
Vikings cozinhando no Equador
A invencível armada posta a pique
Encharcando de sangue o Pacífico

5

Quanto desse sal?

Nenhum comentário: