quarta-feira, 15 de julho de 2009

Os Agentes B

Dino Valls - la nave de los locos

para Rodrigo de Souza Leão
(04/11/1965 - 02/07/2009)


1 – TOP SECRET

O poeta trazia um chip escondido no corpo.
Aos 23 soube que era rastreado –

numa sala escura um monitor Toshiba
piscava uma luz verde que era ele:

se súbito virasse à esquerda
e corresse até o tênis acabar eles saberiam.

Mergulhar por dias em piscina, de escafandro,
ou enfiar o dedo na tomada não adiantava –

era a prova d’água, imune ao curto-circuito.

A luz continuaria piscando, indicando
aos agentes que ele estava onde estava.

Com a faca arrancá-lo seria em vão.
Outro seria posto no lugar do primeiro –

à noite, pelo pai; ou num ato violento por eles.

Novamente internado, voltaria
com a tecnologia re-implantada –

up grade da versão dois ponto zero,
mais moderna, com sinal via satélite.

2 – Fuga e outros movimentos

Certo dia, perseguido por todos,
desceu correndo os treze andares da CEF,
contando cuidadosamente cada degrau.
(Diante do impasse, quase voltou para conferir)

Os macacos em seu encalço
– mordendo o calcanhar do tênis Nike –
seria uma prévia de tantas outras perseguições.
(Análogas às exibidas na Sessão da Tarde)

Aquele era o momento de lamentar não ter fu-
gido com Rimbaud – companheiro de manicômio
onde trocavam figurinhas do time do Flamengo.
(Álbum Campeonato Brasileiro, 1989)

3 – Necrológio

Acordou vinte anos depois
– ressaqueado de Haldol –
seu nome inscrito no obituário.

Levantou da cama
– a hora havia chegado –
e comunicou a todos que iria morrer.


*

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Rodrigo de Souza Leão

Cássio Amaral, Rodrigo, Eu, Ricardo Wagner

Quando fomos ao Rio de Janeiro para tentar, sempre tentar, vender uns livros de poemas, eu não esperava nada além de uma brisa marítima soprando forte, de um trânsito infernal. Clichês pisados e repisados.
E foi nesse passeio que conheci, pessoalmente, Rodrigo de Souza Leão. Já gostava muito de sua poesia. O cara nos recebeu muitíssimo bem e nos propiciou um papo sem igual, nos mostrando uma visão lúcida sobre a poesia contemporânea. Fiquei triste quando me informaram que ele havia morrido.
A passagem na casa de Rodrigo valeu a viagem e muito mais. O podle – que não era azul – chato pra caralho, as pinturas feitas com o chuveirinho do banheiro, cigarro, cheetos e coca ligth: tudo guardado para um poema futuro.
Rodrigo deixa uma obra vasta que merece leitura atenta. Um poeta vigoroso.



MEU PAI QUE NÃO ESTÁ NA FOTO


Comi distância nas pálpebras
Fechadas de minha razão
Pude sentir a minha Loucura
Sempre sorrindo de dentadura

Oro aos sãos que me querem
Tateando o Horizonte dentro
Daquela noite eterna
Em que me deitei em mim

Pra sempre quis estrelas
Quem sabe irei ser um dia
Aquela que adiante guiará
Meu pai no mar da poesia

*Rodrigo de Souza Leão