domingo, 1 de julho de 2012

Inventário de um rio # 2



1
Aquele havia sido o meu Eufrates.
Ainda que inexpressivo
– sequer constava no mapa –
não teria havido nada sem ele


(a água era tão pouca
e de tão má qualidade
– pombos sedentos agonizavam
às suas margens –
que nada sobrevivia em seu bojo
[além de vermes aquáticos
e caramujos da esquistossomose])

Aquele havia sido o meu Aqueronte.
Quando corria –
quase sempre estava engasgado
com o cadáver de cão –
conduzia a inframundos
governados por Hades

(pouca era a sua água
e de tão má qualidade –
espessa como a baba de um condenado –
que ela se mostrava incapaz de refletir o céu
[senão simulá-lo
com um azul de olho vazado])

2
Aquele que havia sido o meu rio
se arrasta por galerias de concreto
– como um fantasma do Lete –
roendo pacientemente os pilares da cidade