Para Betina Ribeiro Rodrigues da Cunha
arte: Hugo Martins
Nada se sabe sobre essa cidade vazia.
Para onde foram os seus não há pista.
Nenhum detetive seria capaz de descobrir,
nenhuma cartomante poderia ajudar.
O semáforo sorteia o verde e o apresenta,
carro algum se disponibiliza a avançar –
estúpido, só o faz mediante chicotadas.
O letreiro luminoso oferece sanduíche,
ninguém para matar a fome ou a sede –
que seja através do saque, às claras:
as portas abertas convidam ao crime,
o cofre bojudo dorme um sono pesado.
Seria um flautista arrebanhando gente,
ou uma promessa de vida melhor adiante?
Pista alguma se encontra que as comprove.
A cidade é a mesma de ontem. E não o é.
O Silêncio que nunca andou por essas ruas,
a Paz que ainda não havia se mostrado,
a Tranqüilidade definitivamente alforriada
são os únicos que por aqui restaram.
Um gás letal terá pegado todos de surpresa
enquanto dormiam ou escovavam os dentes?
Um deus vingativo terá vindo puni-los
pelos séculos de luxúria e lassidão?
Sol e chuva por fim vencerão a luta, come-
rão a parede das casas e a pele do asfalto...
A barragem saciada se romperá
afogando os prédios, soterrando os bairros...
São conjecturas apenas.
Nada se sabe sobre essa cidade vazia.
arte: Hugo Martins
*
21 comentários:
SINCERAMENTE É UM POEMA DIFÍCIL COM PENDOR DE FÁCIL, É UM POEMA QUE URRA MUITO ALÉM DO QUE NÓS PENSAMOS E ACREDITAMOS, UM POEMA QUE TEM IMAGENS DO BIZARRO COM A SITUAÇÃO ATUAL. MANO, MUITO BOM, E OS DESENHOS CASARAM MUITO BEM.
COMPREI MALA NA MÃO & ASAS PRETAS DO PIVA E MAELES COMPROU DOIS DA HILDA HILST.
SAUDADE SUA E DE CONVERSAR COM VOCÊ.
GRANDE ABRAÇO.
"Seria um flautista arrebanhando gente,
ou uma promessa de vida melhor adiante?"
Eis aí, a esperânça o Poema!
:)
Camarada, muito bom o poema!!! A cidade que parece adormecida ressurge das cinzas aos primeiros gemidos da aurora e o turbilhão de gente se atropela por um espaço que é o cenário súbito da tragédia cotidiana.
Abração!!!
eu sei.
é a minha cidade de todos os dias :(
grande poema, camarada!
abraço forte
jorge
bom demais ler poemas seus. ele é algo q um poeta pode ver e falar como ninguém. e vc fez. da gosto de ler muitas vezes. abraços do amigo daqui.
Nolli, é linda a sua conjuntura. Engraçado, tive uma sensação bucólica (tanto com o poema como com as imagens), uma sensação que normalmente é vinculada à boi, capim, igrejinha, cidade do interior. Parece exagero, mas seu poema me fez enxergar melhor a cidade por onde ando.
E pode não ter nada a ver com o assunto, mas esses dias comentei com minha esposa como os carros estacionados em filas duplas enfeiam a cidade, as praças, os lugares onde estão estacionados e ninguém mais percebe isso. Quero dizer, essa cidade vazia mostrou-se até bela para mim (como eu já desconfiava que seria).
Interessante texto, pode ser um prenúncio do que o homem já está fazendo com suas cidades...
Talvez apenas não percebemos e já esteja vazia a muito tempo.
Parabéns pelo poema e pelo dia do escritor!
Maravilha, Rafael, tudo muto demais por aqui, parabens. Adorei este seu espaço. Indicarei nas minhas páginas, aguarde.
Abração
www.luizalbertomachado.com.br
Muito bom Nolli! Quem nunca imaginou sua cidade assim?!...talvez como forma de parar o tempo...ou não deixar a cidade te engolir..
Adorei as ilustras!!
Abs
Esta cidade lembrou-me de um filme assistido, arma química teria devastado a humanidade e os sobreviventes estavam deformados, zumbis e monstros...
Mas talvez seja mesmo o destino da vida no planeta, o homem faz e desfaz em nome do progresso e do consumismo desenfreado... lixos e lixos humanos são amontoados nos montes e mentes... querem mesmo culpar deus por tudo isso, mas esquecem que Ele nos deu um paraíso nos o transformamos em inferno, mas ainda resta a esperança, Os planos de Deus ainda se cumpriram!
conheço essa "cidade".
abraço.
há que desenterrar a história
um dia
e os povos futuros
saberão mais que nós
dessa cidade vazia
Meu caro Nolli,
teus versos sempre diferenciados...densos!
maravilha de poema...é desses que sempre dizem: "gostaria de ter escrito"...rs.
Um poema e porque não dizer um grande texto.
Uma obra ordinaria de verdades onde ida e vindas é o retrato da vida.
Abraços
Na verdade...
muitas das cidades de hoje
estão cheias
de gente vazia!
Forte abraço
Poema de grande visão! Obrigado, meu caro, pelo comentário do Poema Dia e por proporcionar um blog assim. Abração.
Rafael, palavra de tirar o fôlego tal o modo, como desenha a inquietação de um tempo repleto de vazio. "São conjunturas apenas" Mistério que é feito da mais profunda escuridão e, portanto, com mínima chance de desvendamento...
Poema denso. Necessário.
Bjs, poeta. Sempre feliz com a sua visita. Inté!
Rafael, parabéns pelo teu espaço, lugar de muita Poesia e Arte.
E "cidade vazia", foi me desconstruindo até poder imaginar uma cidade futura, talvez agonizante pelo descaso à natureza... enfim, a Natureza parece dizer o que o poeta sente: por fim, sol e chuva vencerão a luta...
Uma abraço poético e quando der deixa rastros lá em Vidráguas (www.vidraguas.com.br)
Carmen Silvia Presotto
este me parece um lugar que alguns de nós tem habitado.
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